Ser gordo, ser ou não ser: eis a questão e o quanto ela é do gordo e o quanto ela é de terceiros

* DISCLAIMER: o portador de sobrepeso é quase sempre, em sua imensa maioria, a VÍTIMA. Somente quando ele se transforma em GORDATIVISTA e passa a ser um obstáculo para a busca de uma vida mais feliz e saudável pelos gordos que não encontram alterntivas é que ele passa a ser O PROBLEMA. Como profissional da área da saúde, eu jamais condenarei uma pessoa gorda. No entanto, os argumentos abaixo são argumentos que GORDATIVISTAS oferecem às vítimas da obesidade e sobrepeso para que elas não resolvam seus problemas e continuem sendo massa de manobra política.

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Bom, de novo eu defendo que lógica e estatística devem ser obrigatórias no ensino básico, caso contrário vira o samba do criolo doido que virou isso aqui. Vamos separar os temas. Darei um título irônico a cada um, mas eles têm um equivalente em lógica:

  1. “Tem gente que estava viva e está morrendo”;
  2. “O que importa é ser feliz” (com som do Pão de Açúcar atrás);
  3. O gordo sofre porque a sociedade é gordofóbica, caso contrário não sofrerira;
  4. O gordo está na dele e não incomoda ninguém: são os magros que vão cagar regra sobre saúde.
  5. Na verdade, ser gordo não é um problema de saúde.

Vamos decompor cada um deles.

  1. Tem gente que estava viva e está morrendo.

É o papo do fumante: “mas minha tia fumou até os 94 anos e morreu de aneurisma”. Isso se chama “evidência anedótica”. Não tem valor nenhum. O que tem valor são os dados epidemiológicos. Os gordativistas não estão de brincadeira, de modo que conseguiram dois ou três trabalhos com metodologia falha que sugerem que um leve sobrepeso é saudável. A comunidade científica rapidamente desconstruiu estes trabalhos, que tinham agenda ideológica.

  1. “O que importa é ser feliz”.

Aí sim: aí está 100% coerente. Só que não pode, como no caso da debatedora sem método em algum lugar (não tenho paciência para buscar isso, achem aí), combinar com o argumento 4, 5 ou 3. Eu experimentei coisas semelhantes à heroína. Tem um dos medicamentos que eu tomo que me causa profunda felicitadade, mas se eu tomar mais um mês, acabou minha vida: a luta contra a dependência de opióide quase sempre é perdida. Que opção difícil: viver sem a droga a felicidade de uma vida de sexo e cumplicidade com meu parceiro, amor este que me causa um “high” psicodélico, com alguns projetos de longo prazo, ou viver a felicidade (intensa e real) desta droga até o talo, e pular fora (da vida). Para mim, que sou uma suicida (não existe ex-suicida: se você tem aquele impulso do Tanatos dentro de você, você é um suicida. Você apenas controla seu amor pelo Nada – duro ouvir isso, né? Só que é verdade). Então realmente, esse argumento é correto: o que importa é ser feliz. Eu defendo a legalização de TODAS (leiam bem, TODAS) as drogas. Acho que todo mundo tem direito de tomar tudo. A liberdade individual jamais pode ser cerceada DESDE QUE o indivíduo arque sozinho com os custos dela. Ou seja: por mim, você pode fumar 3 maços de cigarro por dia. Porque, honestamente, sua vida não tem a menor importância para mim (sem hipocrisia, se importar com a vida de quem não se conhece é impossível. Somos capazes de reagir a imagens de catástrofe e tortura, adotar ações contra sofrimento coletivo, mas não ao individuo sofredor. Além disso, somos todos mais sensíveis ao sofrimento catastrófico: problema de lógica e probabilidade de quem reage. De novo, lógica faria bem). Você fuma e fuma. Mas não pode nem uma molécula da sua fumacinha chegar no meu nariz, porque aí você está ME OPRIMINDO com o seu fedor e eu vou reagir com toda a ferocidade. Mesma coisa o gordo: por mim, você pode comer big Mac até explodir. Desde que não seja o MEU IMPOSTO que vá dar conta do custo do seu tratamento, da sua diálise, da sua internação com cardiopatia – nada. Você come – você paga. Além disso, você come, você paga duas cadeiras no avião e eu viajo de boa, no conforto que o preço da minha passagem individual me dá como direito. Então estamos entendidos: ser feliz é de lei. Eu e o Hugo Quinteiro somos felizes fazendo uma coisa que de tempos em tempos nos leva para o hospital. Alguém viu alguma reclamação da gente? Nem mesmo privilégio de deficiente eu uso quando minha perna quebra (já quebrou e foi operada 3 vezes). Se o consumo de alimento caloricamente denso em alta quantidade, combinado à inatividade (que é sabido causar depressão, de modo que o consumo de alimento caloricamente denso é sua auto-medicação para a depressão) é a chave para a sua felicidade, dou todo apoio para que você vá com tudo. E arque sozinho, mas sozinho MESMO, com as consequências da sua escolha.

Sempre lembrando que a sobrealimentação VOLUNTÁRIA (de indivíduos com algum poder aquisitivo e capazes de entender os conceitos mínimos envolvidos nestes processos fisiológicos) é diferente da sobrealimentação INVOLUNTÁRIA, que é o que observamos nos guetos negros pobres dos Estados Unidos, com crianças pequenas obesas porque o alimento possível é o alimento errado (caloricamente denso e barato).

  1. O gordo sofre porque a sociedade é gordofóbica, caso contrário não sofrerira.

Sim e não. Existe muito preconceito contra gordos. Gordos seguramente estão fora do padrão dominante formolátrico de beleza, assim como as etnias minoritárias não brancas, os deficientes e muitas outras pessoas (incluindo nós, atletas). A sociedade é gordofóbica, mas as gordativistas conquistaram tanto espaço e direitos, que há clusters de ocorrências sociais onde o vetor de opressão se inverte. Em outras palavras, certas situações, locais e configurações sociais nada incomuns permitem que o gordo seja o opressor do magro. E aí, minha gente, vêm os Justiceiros Sociais dizendo que não existe opressão inversa. Ou seja: se o gordo é predominantemente oprimido na sociedade, até que isso seja totalmente suprimido, tudo que um ou mais gordos fizeram contra um magro não conta como opressão. Substitua gordo por mulher, negro, lésbica, etc: o argumento é o mesmo. Se você for massacrado por uma minoria organizada, boa sorte com seu processo. Você terá uma horda deles tornando sua vida um inferno.

  1. O gordo está na dele e não incomoda ninguém: são os magros que vão cagar regra sobre saúde.

Não sei se esse ponto requer comentário. É só pensar nas inúmeras necessidades especiais das quais os gordos já gozam e quem paga somos nós. Além do terror de qualquer um de ter um obeso sentado do seu lado num avião. Já aconteceu comigo e com quase todo mundo que eu conheço. Eu fiz um escândalo e me acharam outro assento. Outras pessoas passaram o inferno, sem respirar direito, sem comer, sem beber água, porque não conseguiram seu direito ao conforto que o assento caro lhe dava.

  1. Na verdade, ser gordo não é um problema de saúde.

Deixo vocês com algumas referências, já que essa afirmação é uma piada de mau gosto:

There has recently been a debate over the thesis according to which overweight people might be actually healthier than fit adults. The original fallacious arguments, its use by activists and scientists response are listed here

https://storify.com/mariliacoutinho/the-healthy-and-fat-fallacy-resources

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