A Maldição da Vizinha Fumante

Só pode ser um feitiço colocado por todos os fumantes que eu incomodei pela vida. A todos que alguma vez me perguntaram, tirando seu cigarrinho da carteira e já se preparando para acender, “incomoda?”, eu respondi: “sim, e é proibido fumar aqui”. “If looks could kill”, como se diz em inglês, eu teria sido fuzilada inúmeras vezes.

Assumo: odeio o cheiro do cigarro, detesto o cheiro de cinzeiros, de estofamentos de locais onde se fuma e de gente fumante. Tudo neles: pele, hálito, cabelo… Simplesmente, fumante FEDE. E eu sou um ser orientado pelo olfato.

Bem, eu tenho uma vizinha que nunca se deu exatamente bem nem mal comigo. Moramos em casas adjacentes há uns 12 anos e eu fui à casa dela uma única vez. Ela nunca entrou aqui. Quando a conheci, ela fumava. Depois parou. Há alguns meses re-começou a fumar.

Imagino que para não incomodar as pessoas da casa, ela tenha escolhido esse lugarzinho no quintal para exercer seu habito detestável. Fica exatamente do lado de uma das janelas laterais da minha casa que deixo sempre aberta, pois é onde fica a gaiola do coelho.

O cheiro entra por lá, percorre o corredor e vem me incomodar aqui, no meu quarto.

Fumantes acham que somos frescos. E especialmente que eu sou fresca, pois minha sensibilidade olfativa é mesmo excepcional (um neurologista idiota me pediu uma ressonância do cérebro inclusive, pois é uma sensibilidade anômala). Mas eu acho que existem outros componentes nessa história, para os dois lados.

Da parte deles é meio óbvia: a adicção e o egoísmo reprimem a racionalidade. Fumaça não é um sólido que se pode conter – ela se espalha! Naturalmente vai incomodar, a não ser que se fume num local fechado com exaustor dotado de filtro.

Da minha parte é mais complicado. Sim, minha sensibilidade olfativa é excepcional. Mas cheiros ruins são processados pela amigdala, o centro de processamento de sinais de stress no cérebro. Esse órgão modula nossa sensibilidade, de modo que ela aumenta ou diminui conforme o stress. Se estamos sozinhos em casa e ouvimos um barulhinho, este sinal dispara uma série de reações neuro-químicas que aumenta nossa sensibilidade para o próximo barulho. O quanto aumenta deve variar conforme a resposta de stress. O mesmo se dá com cheiros.

O cheiro de cigarro é um dos maiores deflagradores de stress em mim. Tenho uma péssima história com fumantes que foram abusivos comigo ao longo da vida, impondo seu hábito, me hostilizando e me humilhando. Isso desde a primeira infância e percorrendo toda a adolescência e idade adulta. Na infância isso ocorria na família onde simplesmente meus protestos eram ignorados e eu recebia olhares de raiva e desprezo. Na adolescência, foi com a ultra-esquerda. Por definição, naquela época, comunista fumava e considerava o protesto de qualquer um contra o cigarro algo pequeno-burguês e “coisa de americano”. Alguns tinham histórias que contavam orgulhosamente de ter entrado em pequenos elevadores com o cigarro aceso para confrontar “reacionários”.

Acho que com os anos isso contribuiu para que minha sensibilidade aumentasse, já que o cheiro de cigarro, ainda que eu não queira, arrasta consigo mil lembranças de violência.

Não consigo deixar de considerar o hábito não apenas imbecil, nojento e auto-destrutivo, mas uma agressão pessoal.

E agora, o que eu faço com a vizinha fumante?…

 

Marilia

 

BodyStuff

 

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