A morte do vagalume

Ontem às duas da manhã, uma coisa fazia “plect… plect… plect…” no escuro, no meu quarto. Tentei ignorar a coisa, mas foi impossível. Concluí que devia ser um inseto, já que a casa está cheia deles, nesse calor infernal, eu morando no meio do mato, fato que em geral eu comemoro, mas nessas circunstâncias acho uma bosta.
Lá pelas tantas, torturada pelo constante “plect… plect… plect…” de algo que obviamente estava pulando, mas não alcançando o que queria, de modo que tentava novamente… e novamente… e novamente…. sem nenhum senso de fracasso ou plano-B, resolvi dar um fim ao nosso sofrimento. Ao meu, que não aguentava mais aquela merda de barulhinho, e “dele” – seja lá quem “ele” fosse, porque era um fracassado que seria misericordiosamente liberado de sua vida sem sentido.
Peguei o inseticida e fui na direção do barulho. Espalhei uma overdose de veneno e deitei.
“Plect… plect…”, só que agora em outro lugar, mais para baixo. O que quer que fosse, caiu. No chão? Talvez.
“Plect… plect… plect…”.
Levantei novamente, puta da vida de verdade e esvaziei o tubo de inseticida na região do chão. O “plect” ficou mais distante do “plect” seguinte.
Das outras duas vezes em que levantei, não vi porra nenhuma, bicho nenhum e não tive saco de procurar. Mas dessa vez fui atrás e encontrei.
Era… um vaga-lume!
Fiquei tão triste…
Se fosse uma barata, não sentiria muita coisa. Se fosse um gafanhoto, lamentaria por ele estar no lugar errado, na hora errada, mas apagaria a luz e dormiria.
Mas era um… vaga-lume! Com aquelas bolinhas luminosas, tão lindas, tão… apelativas…
Me senti infinitamente culpada e dei-lhe uma forte chinelada, o tiro de misericórdia. Ou melhor: o esmagamento de misericórdia.
Se não fosse uma ateísta convicta encomendaria sua alminha a um destino espiritual próprio aos mártires.
Por que? Sei lá. Vaga-lumes são “do bem”. Vaga-lumes são intocáveis. Vaga-lumes supostamente deixam a gente feliz. Não se mata vaga-lume.
É um inseto, mas entra na categoria das coisas que “não se mata”.
Feio matar vaga-lume. Coisa de gente… ruim.
Moral da história: nem todo inseto pode ser assassinado sem tornar você um assassino.
Moral da história dois: não se deve tentar eliminar qualquer barulho que nos incomode o sono.
O que tudo isso tem a ver com corpo? Imagem corporal? Treinamento de força? Maromba?
Porra nenhuma. Só fiquei com vontade de contar minha história sobre a morte do vaga-lume.

Marilia


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